sábado, 28 de junho de 2014

Robert Mapplethorpe - a exposição no Grand Palais


Apesar de estar aberta ao público desde Março, só recentemente ganhei coragem para ir ver a exposição de Robert Mapplethorpe no Grand Palais. Confesso que o autor não me atraía especialmente mas ver fotografias ao vivo nunca é a mesma coisa que vê-las em livros ou ecrãs de computador, sobretudo quando se trata de imagens em analógico. É quase como vermos fotografias de ilhas paradisíacas ou estarmos de facto nessas ilhas!
 
Sendo uma retrospectiva, e como uma boa retrospectiva deve ser, a exposição conta com obras de todo o espólio Mapplethorpe. Começa por uma série de nus realçados pela perfeita harmonia entre luz e sombra, tão característicos do autor, apaixonado por escultura e que pretendia assim imagens próximas desta outra forma de arte.

" Photography is a very quick way to make sculpture. "
Robert Mapplethorpe


Seguem-se as fotografias de flores, algumas delas a cores, faceta que me surpreendeu tendo em conta que o seu trabalho é mais associado ao preto e branco. Não se pense, no entanto, que estas imagens perdem a força, pelo contrário, as cores são bem trabalhadas, muito intensas, partilhando um lugar ex aequo com as irmãs.

Finalmente os retratos, onde é dado um especial destaque a Patti Smith, o primeiro amor e modelo de Mapplethorpe. Outra surpresa da exposição é a apresentação do filme "Still Moving" realizado pelo fotógrafo e em que Patti declama um monólogo, interagindo num cenário composto por cortinas.

Com um sinal de "proibida a entrada a menores", segue-se uma sala com as obras sado-masoquistas, homens com trajes de couro e chicotes, em poses mais ousadas e eróticas. A escolha para esta sala ficou um pouco aquém do que eu esperava, com cerca de 15 ou vinte fotografias apenas, e nem todas assim tão chocantes que justificasse estarem escondidas.

A exposição termina com um aglomerado das polaróides que marcam o início da sua carreira fotográfica, muitos retratos, nos quais já se sente o seu cuidado visual e a procura dos assuntos que vão marcar a sua obra. Para completar a exposição, o Grand Palais disponibilizou ainda um webdocumentário interessante onde são mostrados os locais que Robert Mapplethorpe frequentava e algumas das pessoas que fizeram parte da sua vida.

 "I am looking for perfection in form. I do that with portraits. I do that with cocks. I do that with flowers. " - Robert Mapplethorpe

    Portrait of a Lady, 1982                                                       Thomas, 1986

Uma das coisas importantes deste género de exposição, e que talvez tenha feito uma diferença na minha maneira de ver o seu trabalho, é que a obra está contextualizada com o percurso do autor. Homossexual, vive numa Nova Iorque em plena libertação sexual, que ele retrata através das suas imagens de partes de corpos masculinos, de homens a dançar ou a beijar-se, mas também através da sua musa Lisa Lyon, boddy builder que aparece em muitas das suas fotografias. Ele procura intensamente mostrar-se como um artista com um corpo de trabalho coeso, mostrando da mesma forma um pénis ou uma flor.
 
Apesar de estarem extremamente bem estruturadas e de darem uma ideia real do seu trabalho, as cerca de 250 imagens apresentadas sabem a pouco e no final fica no ar a espera por uma surpresa, uma fotografia mais inédita e inesperada.

A exposição pode ser visitada até dia 13 de julho no Grand Palais, em Paris. 


quinta-feira, 26 de junho de 2014

Os Cantos Walé de Patrick Willocq


É uma antiga tradição da República Democrática do Congo à qual as comunidades deram continuidade até aos nossos dias. A mulher, ao ter o seu primeiro filho, torna-se uma walé, "mulher em aleitamento", regressando a casa dos pais onde vive num clima de reclusão que pode prolongar-se por alguns anos. A uma walé é proibido  ter intimidade com um homem e fazer qualquer esforço que não seja a construção de cestos de verga e aprender as canções que relatam esse período de reclusão.
As canções retratam as suas relações com os pais e com o marido, por vezes através de comparações com animais. As mulheres interpretam-nas no fim do seu período de isolamento, num espectátulo de três horas que dão para o resto da sua tribo.


A tradição walé será assim uma espécie de hino à maternidade, que tem como função proteger a mãe e o recém-nascido, mas também fazer um controlo da natalidade, de forma a que os nascimentos sejam mais espaçados.


Patrick Willocq, fotógrafo francês crescido no Congo, deu corpo às canções destas mulheres, encenando-as em verdadeiros palcos feitos a partir das mais variadas matérias. O resultado são umas imagens cândidas mas cheias de vida, que nos transportam de novo à nossa infância.Uma maneira original de documentar esta tradição.

O trabalhado, entitulado "I'm a Walé, Respect Me", pode ser visto de 7 de julho a 21 de setembro nos Rencontres d'Arles.

Fontes: 
Revista Polka #26
Patrick Willocq